sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Está frio.

Está frio. Sim, está. Em casa, resgataram-se as luvas, gorros e os cachecóis perdidos algures numa gaveta (daquelas que se esquecem…). Abotoou-se o casaco até ao fim. Contou-se até três para se ganhar coragem, abrir a porta e sair. Deixou-se para trás o cobertor, o aquecedor, a água quente do banho e a chávena de chá da noite anterior. Na cabeça, ecoou a palavra “alerta”, na voz do jornalista do telejornal da noite anterior. Apeteceu voltar e por lá ficar. Só até ao frio passar. Mas não.
Aconchega-se o corpo por entre tantas camadas de roupa, que por muitas que sejam parecem sempre tão poucas. Atravessa-se a rua a passos largos, de rosto quase vendado (tem vergonha do frio, se calhar). Apenas os olhos ficam por tapar… Afinal de contas, o frio não se vê, a não ser graças às pintinhas que deixa na pele arrepiada, espécie de rasto efémero. Vai-se sonhando com o café quente que aguarda no balcão de sempre. Já se ouve o tilintar da chávena quando nela bate a colher que, com tanta volta, lá dissolve o açúcar. E custa tanto respirar. E os movimentos estão perros como se há muito não se soubesse o que é dobrar um joelho, ou simplesmente, esticar o dedo indicador. E o nariz está vermelho, tal e qual rena Rudolfo. E os lábios ardem. E as bochechas congelam. E os bolsos não chegam para manter as mãos quentes. Mas pensa-se: “está quase”. E tudo parece custar menos. Até o frio.
E está mesmo. A porta de entrada é já ali. Uma última corrida. Um sorriso vitorioso, de sobrevivente. "Já passou", pensa-se. De repente, um espirro. É a derrota no jogo da “apanhada” com o frio. Resta ir em busca do reconfortante café...


(Hoje também atravessei a rua. Estava frio. Atravessei-a e cruzei-me com tantos que, como eu, sonhavam com o café quente. Que, como eu, jogavam à “apanhada” com o frio. Pensei que “estava quase”. E nem agora o frio me parece menor.)